Thursday, October 28, 2010

Carta à Maria Augusta


Salvador, 18 de Outubro de 2010.

Carta à Maria Augusta,

No dia 25 de outubro tive a oportunidade de conhecê-la melhor.
Em Mab sempre pude observar um brilho nos olhos característico, próprio. Mas, em estados alterados de consciência, as regras da percepção comum são rompidas, já diziam os surrealistas, e acredito que por isso que Maria Augusta despertou em mim um verdadeiro estado de vontade, e me levou até a fronteira, quase insipiente, entre onde começa a vida e a morte.
Maria Augusta nos convida a passar por um sentimento de permanência no tempo e no espaço, seu corpo é constantemente suportado por algo invisível. “Situa-se entre a espontaneidade e o controle absoluto, entre um corpo natural ou espontâneo e um corpo-marionete.” (PAVIS, 2001, p. 15).
Um “corpo dócil” preparado para ser não somente obediente, como também realizar tudo o que o sistema exigir?
A presença sutil do ballet clássico na obra dinamiza as energias potenciais e leva a intérprete e o espectador sempre além. As forças contrárias, os impulsos, as intenções musculares, ajudam a articular a presença cênica de forma orgânica. A repetição e o enclausuramento dos micromovimentos, a intenção, o élan.. a ação física propriamente dita.. o impulso vital..
Depois de alguns minutos o resultado do trabalho físico aparece refletido nas ações realizadas em cena, o suor, o tônus.. algo parece sempre estar sendo arremessado de dentro pra fora, e vai criando os nós (interseções) que apresentam momentos/movimentos de tensão, e na rede tecida pela justaposição de formas é possível vislumbrar o princípio ideogramático que relaciona essas idéias/imagens.
Essa tensão que surge em um corpo amarrado lá no início, percorre toda a obra, como o trilho de um trem, um constante estado de turbulência onde esse corpo central é força, segmentação, enraizamento, energia; capaz de materializar diferentes qualidades de vibração na busca de uma expressividade pessoal.
A imagem que me submeteu é que Maria Augusta fora lançada em um buraco negro, uma região do espaço-tempo da qual não é possível escapar para o intuito.
Na obra não há nada para se contemplar, mas para se experienciar junto.


Inaê Moreira.

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